Queloides constituem uma proliferação anormal de
fibroblastos após injúria da pele que ultrapassam bordas da ferida, causando
aparência inestética e grande prejuízo à qualidade de vida destes pacientes.
Atualmente não há uma terapêutica combinada eficaz para redução das massas
queloidianas, inibindo sua recidiva. Neste trabalho apresentamos uma série de
casos tratados com uma associação de técnicas (excisão cirúrgica pela técnica
de shaving, injeção intralesional de corticosteroide e/ou bleomicina, aplicação
de placa de gel de silicone, luz intensa pulsada, laser de CO2 fracionado,
laser Nd:YAG, laser Erbium:Glass e LED vermelho e infravermelho), atuando na
fisiopatologia do queloide, que demonstraram resultados satisfatórios e
duradouros.
Introdução
A
incidência é maior em indivíduos com fototipos de Fitzpatrick elevados e as
regiões corporais mais afetadas são face, lóbulo auricular, região esternal,
ombros e áreas mais ricas em melanócitos. O diagnóstico é essencialmente
clínico e o paciente pode referir dor, prurido, hipersensibilidade, limitação
de movimento, desconforto social e psíquico devido aparência inestética,
causando grande prejuízo à qualidade de vida1-5.
Nenhuma terapêutica isolada demonstrou ser totalmente eficaz
para tratamento do queloide. No presente estudo apresentamos pacientes com
queloides, decorrentes de acne, tratados com sucesso em uma sequência
organizada de combinação de variadas técnicas.
Figura 1 - Paciente A antes do tratamento.
Figura 2 - Paciente A - shaving nas lesões à direita e
excisão intralesional com sutura em lesões à esquerda.
Figura 3 - Paciente A após tratamento.
Figura 4 - Paciente B antes tratamento.
Figura 5 - Paciente B após tratamento.
Métodos
Foram tratados, entre 2008 e 2013, três pacientes com idades
entre 22 e 39 anos, fototipos II a IV, que apresentavam em comum cicatrizes do
tipo queloide em face, tórax anterior e ombros decorrentes de acne.
Paciente A: masculino, 39 anos, fototipo IV, com queloides
extensos decorrente de acne em região esternal, foi submetido a quatro shavings
com lâmina de barbear do relevo da lesão, com intervalo mínimo entre elas de
quatro meses. Todas as sessões foram acompanhadas de infiltração intralesional
de triancinolona ou bleomicina. Além disso, foi submetido a uma sessão de laser
Erbium:Glass, uma sessão de Luz Intensa Pulsada (LIP) e 19 sessões de LED
(Ligth Emitting Diode) vermelho e infravermelho. A duração do tratamento foi 42
meses (Figuras 1, 2 e 3). Paciente fez uso complementar de placas de silicone.
Paciente B: feminino, 29 anos, fototipo II, com cicatriz de
acne queloidiana em face, foi submetida a três shavings, 11 infiltrações
intralesionais de triancinolona ou bleomicina, uma sessão de laser Erbium:Glass
e duas sessões de LIP, num período de 36 meses (Figuras 4 e 5).
Paciente C: masculino, 22 anos, fototipo III, com cicatrizes
decorrentes de acne do tipo queloide em tórax anterior, posterior e ombros, foi
submetido a duas excisões cirúrgicas, 19 infiltrações intralesionais de
triancinolona ou bleomicina, uma sessão de LIP, 18 sessões de LED vermelho e
infravermelho, 5 sessões de laser de CO2 fracionado e 6 sessões de Neodym:YAG
laser (Nd:YAG). O tratamento completo teve duração de 31 meses (Figuras 6, 7 e
8).
Todos pacientes foram tratados de maneira organizada,
conforme a fisiopatologia dos queloides, promovendo inicialmente diminuição da
massa, mecanismos de inibição e prevenção de seu crescimento e finalmente tratamento
da coloração.
Primariamente realizamos remoção das massas queloidianas
através da técnica de shaving com lâmina de barbear, a fim de evitar a injúria
da pele normal com consequente estímulo da formação de um novo queloide. Esta
técnica foi comparada com a remoção cirúrgica da porção interna do queloide do
paciente A e demonstrou ser superior (Figura 4).
Imediatamente após o shaving realizamos infiltração de
triancinolona (20 mg/ml diluída em partes iguais com xilocaína com
vasoconstritor) ou bleomicina (diluída em 8 ml de solução com 7 ml de xilocaína
sem vasoconstritor) para promover atrofia e inibição de crescimento. A
distância entre os pontos das infiltrações foi de 1 a 2 mm até o branqueamento
total da lesão.
Após a infiltração realizamos LED infravermelho (20 minutos)
e vermelho (20 minutos). Em seguida foi solicitado o uso da placa de gel de
silicone a todos pacientes de maneira obrigatória.
A fim de inibir a inflamação, todos pacientes foram
submetidos semanalmente a sessões de LED infravermelho e vermelho e mensalmente
a infiltração intralesional.
Figura 6 - Paciente C antes do tratamento.
Figura 7 - Paciente C durante tratamento.
Figura 8 - Paciente C após tratamento.
No final, com intuito de diminuir a coloração dos queloides
e melhorar o aspecto da cicatriz, alternamos LIP (filtro de 540 nm, 20 ms,
16-20 J) ou laser Nd:YAG (1064 nm, 30 ms, 90-100 J) e laser de CO2 fracionado,
sempre seguidos de infiltração intralesional, já que todos métodos térmicos
estimulam a produção de colágeno e por isso deve ser inibidos.
Para controle realizamos infiltração intralesional a cada
dois meses por um ano e, posteriormente, a cada três meses.
Discussão
Excisão com lâminas flexíveis ou shaving com lâmina de
barbear é uma técnica que vem sendo utilizada com sucesso no tratamento de
lesões superficiais. Uma lâmina de barbear flexível é mantida entre dois dedos
e usada para realizar a exérese tangencial intralesional. A profundidade da
excisão é controlada pelo cirurgião, de acordo com a curvatura imposta à
lâmina. Anestesia tumescente é indispensável nessa técnica, pois o turgor
cutâneo e o edema resultante facilitam o deslizamento da lâmina através dos
tecidos e a possibilidade de excisar finas camadas de pele6-8. Não há na
literatura estudos grandes que utilizassem essa técnica para o manejo do
queloide. A maioria dos estudos com utilização de terapêutica cirúrgica para o
queloide utiliza a técnica de excisão intralesional e sutura. As taxas de
recorrência de queloides após excisão variam entre 45% e 100%. Por esse motivo,
a intervenção cirúrgica é frequentemente seguida por terapia adjuvante, tais
como injeção de corticosteroides, bleomicina, entre outros3,8,9.
A infiltração intralesional com corticosteroide é
terapêutica bem conhecida e utilizada para o tratamento do queloide desde
meados 1960. Ocorre a interrupção do processo inflamatório, vasoconstrição e
atividade antimitótica nos fibroblastos e queratinócitos1. As taxas de resposta
são altamente variáveis, com valores que variam de 50% a 100%, e uma taxa de
recorrência de 9% a 50%. As injeções de triancinolona podem proporcionar alívio
sintomático do prurido e os efeitos colaterais incluem atrofia cutânea,
telangiectasia e dor no local da injeção2,10-12. Estudos apontam que a injeção
de triancinolona por si só é eficaz em reduzir o volume das lesões na maioria
dos pacientes (nível de evidência A)10,11,13. Syed e Bayat utilizaram uma
combinação de três esteroides conhecidos: dexametasona, triancinolona e
metilprednisolona e sugeriram que a eficácia pode ser superior à utilização de
um único esteroide. Com estas evidências disponíveis, esteroides intralesionais
devem ser considerados como a primeira linha de tratamento para queloides12-14.
A bleomicina é um polipeptídeo citotóxico com propriedades
antitumorais, antibacterianas e antivirais, isolado a partir do fungo
Streptomyces verticillus. O efeito ativo da bleomicina usado no tratamento de
queloides é a inibição da síntese de colágeno pelos fibroblastos através de
diminuição da estimulação por fatores de crescimento.
Conclusão
A utilização de tratamentos isolados para o queloide é
cientificamente comprovada, porém poucos trabalhos descrevem associações com
efetividade e longo período sem recidivas. Neste estudo realizamos uma
combinação de terapias que, quando associadas, ainda não havia evidência
científica consistente, com resultados satisfatórios e longo período de
acompanhamento. A associação de variadas técnicas atuando na fisiopatologia do
queloide demonstra ser uma ótima opção para melhora e manejo do queloide.